segunda-feira, 27 de setembro de 2010

A Nova Eva

INTRODUÇÃO


Nos escritos do Novo Testamento, São Paulo explicitamente nos remete a Adão, em se tratando de Jesus Cristo (I Coríntios 15,21-22; Romanos 5,17), na perspectiva de que Jesus Cristo realiza uma nova criação através de sua morte e ressurreição. São Lucas, discípulo de São Paulo, também demonstra esta figuração uma vez que estende a genealogia de Jesus Cristo até Adão.

Desta nova criação participamos quando somos batizados, renascidos da água e do Espírito (São João 3,5). Por isso a Igreja Católica crê na eficiência do batismo, como sacramento de inserção do fiel ao corpo único de Cristo.

Como em Deus “não há mudança nem sombra de variação”(São Tiago, 1,17) e como Ele quis fornecer uma ajudadora, Eva, a Adão, quis também que Jesus Cristo tivesse (e tenha) uma ajudadora, Maria. Assim, desde o primeiro século, a Tradição e o Magistério da Igreja Católica entendem Maria como a nova Eva, a mãe dos viventes, gerados por Cristo.



SAGRADA TRADIÇÃO



A literatura dos Pais Apostólicos contém diversas passagens em que reconhecem e ensinam a verdadeira fé de que Maria é a nova Eva. Desta maneira, desde os primeiros escritos após a era Apostólica, a visão de Maria como a nova Eva é bem estabelecida.

Justino Mártir (100 – 165) nos mostra que Eva, a mãe dos viventes da velha economia, gerou a desobediência e a morte, Nossa Senhora, no entanto, concebeu fé e alegria.

Entendemos que [Jesus] se fez homem, por meio da virgem, a fim de que o caminho que deu origem à desobediência instigada pela serpente fosse também o caminho que destruísse a desobediência. Eva era virgem e incorrupta; concebendo a palavra da serpente, gerou a desobediência e a morte. A Virgem Maria, porém, concebeu fé e alegria quando o anjo Gabriel lhe anunciou a boa nova de que o Espírito do Senhor viria sobre ela; a força do Altíssimo a cobriria com sua sombra, de modo que o Santo que dela nasceria seria o Filho de Deus. Então respondeu ela: 'Faça-se em mim segundo a tua palavra'. Da Virgem, portanto, nasceu Jesus, de quem falam as Escrituras (...) aquele por quem Deus destrói a serpente (Diálogo com Trifão 100,4-5).


Santo Irineu de Lião (130 – 202), discípulo de Policarpo, que foi discípulo de São João, vai mais além, nos mostrando que a virgem Eva desobediente que foi, tornou-se, para os seres humanos, causa de morte. Maria, a virgem obediente e confiante, tornou-se causa de salvação para toda a humanidade:


Por conseguinte (...) encontra-se Maria, virgem obediente (...) Eva, ainda virgem, fez-se desobediente e tornou-se para si e para todo o gênero humano causa de morte. Maria, virgem obediente, tornou-se para si e para todo o gênero humano causa da salvação. A partir de Maria até Eva retoma-se o mesmo círculo. Não existe outro modo de desatar o nó a não ser fazendo com que os fios da corda onde se deu o nó percorram o sentido contrário (...) Eis porque Lucas inicia a genealogia de Jesus começando pelo Senhor indo até Adão [Luc. 3,23-38], evidenciando que o verdadeiro movimento da geração não procede dos antepassados até Cristo, mas vai de Cristo a eles segundo o Evangelho da Vida. Assim é que a desobediência de Eva foi resgatada pela obediência de Maria. Com efeito, o nó que a virgem Eva atou com a incredulidade, Maria o desatou com a fé. (Contra as Heresias 3,22,4).

Da mesma forma que aquela (Eva) foi seduzida para desobedecer a Deus, esta (Maria) foi persuadida a obedecer a Deus, por ser ela, a Virgem Maria, a advogada de Eva. Assim, o gênero humano, submetido à morte por uma virgem, foi dela libertado por uma Virgem, tornando-se contrabalanceada a desobediência de uma virgem pela obediência de outra". (Contra as Heresias 5,19).

(...) Era justo e necessário que Adão fosse restaurado em Cristo, a fim de que o mortal fosse absorvido e tragado pela imortalidade e Eva fosse reconstruída em Maria. Deste modo, uma Virgem feita advogada de uma virgem, cancelou e anulou a desobediência de uma virgem com a sua obediência de virgem. (Demonstração da Pregação Apostólica 33).


Epifânio de Salamina (? – 403) se inspira na Sagrada Escritura, especificamente em Romanos 5,17-21, para demonstrar a superabundância da graça de Maria:

Eva trouxe ao gênero humano uma causa de morte: por ela, a morte entrou no orbe da terra; Maria trouxe uma causa de vida e por ela a vida se estendeu a nós. Foi por isso que o Filho de Deus veio a este mundo: para que, onde abundou o delito, superabundasse a graça; onde a morte havia chegado, aí chegou a vida, para tomar seu lugar; e aquele mesmo que nasceu da mulher para ser nossa vida, haveria de expulsar a morte, introduzida pela mulher. Quando ainda virgem no paraíso, Eva desagradou a Deus por sua desobediência. Por isto mesmo emanou da Virgem [Maria] a obediência própria da graça, depois que se anunciou o advento do Verbo revestido de corpo, o advento da eterna Vida do céu. (Epifânio de Salamita em Panárion 78,18,1-3).


Vejamos o paralelo que existe entre este conceito de Epifânio e o teor destes versos de São Paulo.

Se pelo pecado de um só homem reinou a morte (por esse único homem), muito mais aqueles que receberam a abundância da graça e o dom da justiça reinarão na vida por um só, que é Jesus Cristo! Portanto, como pelo pecado de um só a condenação se estendeu a todos os homens, assim por um único ato de justiça recebem todos os homens a justificação que dá a vida. Assim como pela desobediência de um só homem foram todos constituídos pecadores, assim pela obediência de um só todos se tornarão justos. Sobreveio a lei para que abundasse o pecado. Mas onde abundou o pecado, superabundou a graça. Assim como o pecado reinou para a morte, assim também a graça reinaria pela justiça para a vida eterna, por meio de Jesus Cristo, nosso Senhor. (Romanos 5,17-21).


Nestas palavras vemos que São Paulo mostrava Jesus como defensor, advogado, de Adão, mas também Eva precisava de uma defensora, que a libertasse do jugo do acusador da humanidade. Somente Maria cumpre este papel de defender o gênero feminino da culpa inicial. Assim, onde abundou a desobediência, em Eva, superabundou a graça, em Maria. Afinal, ouçamos as palavras do arcanjo São Gabriel: “Ave, gratia plena”.

Santo Agostinho (354 – 430), um dos maiores doutores da Igreja, vê esta mesma necessidade de restauração da humanidade passando pelo seio de uma virgem:

Pelo sexo feminino caiu o homem e pelo sexo feminino encontrou o homem a sua reparação, pois uma Virgem deu à luz ao Cristo; e uma mulher anunciou a ressurreição! Pela mulher veio a morte; pela mulher chegou a vida! (Sermão 232,2).

Nossa primeira queda teve lugar quando a mulher de quem herdamos a morte concebeu, em seu coração, o veneno da serpente. A serpente, com efeito, a persuadiu a pecar e este mau conselho encontrou guarida em seus ouvidos. Se nossa primeira queda teve lugar quando a mulher concebeu em seu coração o veneno da serpente, não há de estranhar-nos que nossa saúde tenha sido restaurada quando outra mulher concebeu em seu seio a carne do Todo-Poderoso. Um e outro sexo tinham caído; um e outro tinham que ser restaurados. Por uma mulher fomos entregues à morte; por uma mulher nos foi devolvida a saúde. (Sermão 289,2).

Ora acontece aqui um grande mistério, pois, assim como por uma mulher a morte veio até nós, a vida vem a nascer para nós, por meio de uma mulher. De tal forma que, por uma e outra natureza, isto é, a feminina e a masculina, o demônio havia de ser vencido e atormentado. (O Combate Cristão 22,24)


Efrém da Síria (306 – 373) demonstra que Maria, além de ser a nova Eva, também é o canal, “jardim”, pelo qual desce do Pai a “a chuva de bênçãos”.

O anjo Gabriel foi enviado a Maria para preparar uma morada para o seu Senhor. Nela, a raça dos homens vis e insignificantes se uniu com a raça divina que está acima de todas as paixões (...)Pela prole de Maria, tem sido abençoada aquela mãe que foi amaldiçoada em seus filhos, trazendo bênçãos, as mais profundas, a esta mulher cuja prole destruiu a morte e a satanás. E no seio de Maria se fez criança Aquele que é igual do Pai desde a eternidade. Comunicou-nos Sua grandeza e assumiu nossa pequenez; conosco se fez mortal e nos infundiu Sua vida a fim de livrar-nos da morte (...) Maria é o jardim ao qual desceu do Pai a chuva de bênçãos. Esta aspersão chegou até o rosto de Adão e, assim, este recobrou a vida e se levantou do sepulcro, já que por seus inimigos tinha sido sepultado no Xeol. (Carmina Soguita 1).


Assim, muito dos pais da Igreja, aqueles responsáveis por guardar o tesouro apostólico, a sã doutrina da Igreja, captaram desde cedo a analogia entre Eva, nossa mãe na Economia do Pecado, e Maria, nossa mãe na Economia da Graça.



SANTO MAGISTÉRIO



O Magistério da Igreja, em consonância com a Tradição Apostólica, acompanha esta realidade, como podemos ver nos parágrafos 494 e 2618, do Catecismo Católico:

494 Ao anúncio de que, sem conhecer homem algum, ela conceberia o Filho do Altíssimo pela virtude do Espírito Santo, Maria respondeu com a "obediência da fé", certa de que "nada é impossível a Deus": "Eu sou a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra" (São Lucas, 1:37-38). Assim, dando à Palavra de Deus o seu consentimento, Maria se tomou Mãe de Jesus e, abraçando de todo o coração, sem que nenhum pecado a retivesse, a vontade divina de salvação, entregou-se ela mesma totalmente à pessoa e à obra de seu Filho, para servir, na dependência dele e com Ele, pela graça de Deus, ao Mistério da Redenção:

Como diz Santo Irineu, "obedecendo, se fez causa de salvação tanto para si como para todo o gênero humano". Do mesmo modo, não poucos antigos Padres dizem com ele: "O nó da desobediência de Eva foi desfeito pela obediência de Maria; o que a virgem Eva ligou pela incredulidade a virgem Maria desligou pela fé”. Comparando Maria com Eva, chamam Maria de "mãe dos viventes" e com frequência afirmam: "Veio a morte por Eva e a vida por Maria”.

2618 O Evangelho nos revela como Maria ora e intercede na fé: em Caná, a mãe de Jesus pede a seu filho pelas necessidades de um banquete de núpcias, sinal de outro Banquete, o das núpcias do Cordeiro, que dá seu Corpo e Sangue a pedido da Igreja, sua Esposa. E é na hora da nova Aliança, ao pé da Cruz, que Maria é ouvida como a Mulher, a nova Eva, a verdadeira "mãe dos vivos”.


Também os Papas Paulo VI e João Paulo II, munidos do cajado de São Pedro, pastoreando o rebanho de Cristo, o Bom Pastor, nos falam de Maria e a contemplam como a nova Eva:

Se, pois contemplarmos a humilde Virgem de Nazaré na auréola das suas prerrogativas e das suas virtudes, vê-la-emos refulgir ao nosso olhar como a Nova Eva, a excelsa Filha de Sião, o vértice do Antigo Testamento e a aurora do Novo, na qual se realizou a “plenitude do tempo” (Gal 4,4 [...].”(SS. Paulo VI, in Signum Magnum, 10)

[...] Relativamente a Maria, por sua vez, é celebrada (a Anunciação do Senhor) como festa da nova Eva, virgem obediente e fiel, que, com o seu "fiat" generoso (cf. Lc 1,38), se torna, por obra do Espírito Santo, Mãe de Deus, mas ao mesmo tempo também, Mãe dos viventes, e, ao acolher no seu seio o único Mediador (cf.1Tm 2,5), verdadeira Arca da Aliança e verdadeiro Templo de Deus; ademais, em memória de um momento culminante do diálogo de salvação entre Deus e o homem, e em comemoração do livre consentimento da Santíssima Virgem e do seu concurso no plano da Redenção. [...] (SS. Paulo VI, in Marialis Cultus)

À luz desta comparação com Eva, os mesmos Padres - como recorda ainda o Concílio (Vaticano II) - chamam a Maria "mãe dos vivos" e afirmam muitas vezes: "A morte veio por Eva, a vida por meio de Maria" [...]. (SS. João Paulo II, in Redemptoris Mater 19)

[...] Contra a "suspeita" que o "pai da mentira" fez nascer no coração de Eva, a primeira mulher, Maria, a quem a tradição costuma chamar "nova Eva" e verdadeira "mãe dos vivos", proclama com vigor a não ofuscada verdade acerca de Deus: o Deus santo e omnipotente, que desde o princípio é a fonte de todas as dádivas, aquele que "fez grandes coisas" nela, Maria, assim como em todo o universo. [...]” (SS. João Paulo II, in Redemptoris Mater 37)



SAGRADA ESCRITURA



Vimos, de maneira sucinta, o agir de Deus através da Tradição Apostólica e do Sagrado Magistério demonstrando que Eva foi tipo de Maria, assim como Adão foi tipo de Jesus. Esta tipificação de Maria, como a nova Eva, é motivo de grande alegria para todo cristão.

O objetivo do presente artigo é elencar, da Sagrada Escritura, os pontos em que os escritores sagrados, inspirados pelo Espírito Santo, já nos mostravam como Maria se fazia a nova Eva, sendo a nova mãe dos viventes, dos gerados por Cristo Jesus. Rogamos ao Deus Todo Poderoso nos permitir cumprir esta empreitada, uma vez que “a Sagrada Tradição e a Sagrada Escritura constituem um só depósito sagrado da Palavra de Deus” e que “a Sagrada Tradição, a Sagrada Escritura e o magistério da Igreja, segundo o sapientíssimo desígnio de Deus, de maneira se unem e se associam que um sem os outros não se mantém, e todos juntos, cada um a seu modo, sob a ação do mesmo Espírito Santo, contribuem eficazmente para a salvação das almas. ”.



Mulher



O primeiro ponto a ser enfocado, ou a primeira pista de que Maria é a nova Eva, símbolo da nova Igreja que estava nascendo, é a forma como os Evangelhos se referem à Maria.

Vemos pelo Evangelho de São Lucas que Maria e José foram pais preocupados e que Jesus lhes era submisso, enquanto não iniciava seu ministério aqui na Terra, contudo podemos citar duas passagens em que Maria é chamada simplesmente de mulher por Jesus:

Respondeu-lhe Jesus: Mulher, isso compete a nós? Minha hora ainda não chegou. (São João 2,4).

Quando Jesus viu sua mãe e perto dela o discípulo que amava, disse à sua mãe: Mulher, eis aí teu filho. Depois disse ao discípulo: Eis aí tua mãe. E dessa hora em diante o discípulo a levou para a sua casa. São João 19,26-27.


Este tratamento um pouco rústico, à primeira vista, de um filho para com sua mãe, nos revela uma intenção subjacente de Jesus: mostrar-nos um dos títulos como sua mãe deveria ser lembrada, pois encontramos paralelo deste tratamento, em Gênesis, quando Deus trata Eva por mulher:

Porei ódio entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a dela. Esta te ferirá a cabeça, e tu ferirás o calcanhar. (Gênesis 3,15).


É o Deus-Filho chamando Maria por mulher, da mesma maneira como Deus-Pai se dirigira a Eva.



A queda da humanidade e o primeiro milagre de Jesus



Podemos ver Maria como nova Eva, ao nos atentarmos para o paralelismo entre o relato da queda da humanidade e o primeiro milagre de Jesus.

Segue o relato da queda de Adão e, por conseguinte de toda a humanidade:

A serpente era o mais astuto de todos os animais dos campos que o Senhor Deus tinha formado. Ela disse a mulher: É verdade que Deus vos proibiu comer do fruto de toda árvore do jardim?” A mulher respondeu-lhe: Podemos comer do fruto das árvores do jardim. Mas do fruto da árvore que está no meio do jardim, Deus disse: Vós não comereis dele, nem o tocareis, para que não morrais.” “Oh, não! – tornou a serpente – vós não morrereis! Mas Deus bem sabe que, no dia em que dele comerdes, vossos olhos se abrirão, e sereis como deuses, conhecedores do bem e do mal.” A mulher, vendo que o fruto da árvore era bom para comer, de agradável aspecto e mui apropriado para abrir a inteligência, tomou dele, comeu, e o apresentou também ao seu marido, que comeu igualmente. Então os seus olhos abriram-se; e, vendo que estavam nus, tomaram folhas de figueira, ligaram-nas e fizeram cinturas para si. E eis que ouviram o barulho (dos passos) do Senhor Deus que passeava no jardim, à hora da brisa da tarde. O homem e sua mulher esconderam-se da face do Senhor Deus, no meio das árvores do jardim. Mas o Senhor Deus chamou o homem, e disse-lhe: “Onde estás?” E ele respondeu: “Ouvi o barulho dos vossos passos no jardim; tive medo, porque estou nu; e ocultei-me.” O Senhor Deus disse: “Quem te revelou que estavas nu? Terias tu porventura comido do fruto da árvore que eu te havia proibido de comer?” O homem respondeu: “A mulher que pusestes ao meu lado apresentou-me deste fruto, e eu comi.” O Senhor Deus disse à mulher: Porque fizeste isso?” “A serpente enganou-me,– respondeu ela – e eu comi.” Então o Senhor Deus disse à serpente: “Porque fizeste isso, serás maldita entre todos os animais e feras dos campos; andarás de rastos sobre o teu ventre e comerás o pó todos os dias de tua vida. Porei ódio entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a dela. Esta te ferirá a cabeça, e tu ferirás o calcanhar.” Disse também à mulher: Multiplicarei os sofrimentos de teu parto; darás à luz com dores, teus desejos te impelirão para o teu marido e tu estarás sob o seu domínio.” E disse em seguida ao homem: “Porque ouviste a voz de tua mulher e comeste do fruto da árvore que eu te havia proibido comer, maldita seja a terra por tua causa. Tirarás dela com trabalhos penosos o teu sustento todos os dias de tua vida. Ela te produzirá espinhos e abrolhos, e tu comerás a erva da terra. Comerás o teu pão com o suor do teu rosto, até que voltes à terra de que foste tirado; porque és pó, e pó te hás de tornar.” (Gênesis 3,1-19)


Podemos entender do texto, que Eva, a primeira mulher, sob influência de satanás, deu a fruta da árvore a Adão, levando ao chamado Pecado Original, o qual todos estamos antes de sermos considerados da família de Jesus, ou seja, filhos de Deus pelo batismo.

Em paralelo, o novo Adão precisou encarnar para redimir o primeiro Adão. A queda da humanidade foi, então, provocada pelo rompimento de uma lei, esta lei, pedagoga do pecado foi se desenvolvendo até Jesus. Era necessário que a salvação viesse pela graça.

Do mesmo modo que o entendimento do pecado foi se desenvolvendo, a construção ministerial de Jesus, para abundar a graça, foi sendo mostrada primeiramente pelos sinais que operava, mediante seus milagres.

Quis o bom Deus que o novo Adão fosse levado a operar o primeiro sinal mediante a nova Eva. Isto fica premente pela passagem das bodas de Caná:


Três dias depois, celebravam-se bodas em Caná da Galiléia, e achava-se ali a mãe de Jesus. Também foram convidados Jesus e os seus discípulos. Como viesse a faltar vinho, a mãe de Jesus disse-lhe: Eles já não têm vinho. Respondeu-lhe Jesus: Mulher, isso compete a nós? Minha hora ainda não chegou. Disse, então, sua mãe aos serventes: Fazei o que ele vos disser. Ora, achavam-se ali seis talhas de pedra para as purificações dos judeus, que continham cada qual duas ou três medidas. Jesus ordena-lhes: Enchei as talhas de água. Eles encheram-nas até em cima. Tirai agora , disse-lhes Jesus, e levai ao chefe dos serventes. E levaram. Logo que o chefe dos serventes provou da água tornada vinho, não sabendo de onde era (se bem que o soubessem os serventes, pois tinham tirado a água), chamou o noivo e disse-lhe: É costume servir primeiro o vinho bom e, depois, quando os convidados já estão quase embriagados, servir o menos bom. Mas tu guardaste o vinho melhor até agora. Este foi o primeiro milagre de Jesus; realizou-o em Caná da Galiléia. Manifestou a sua glória, e os seus discípulos creram nele. Depois disso, desceu para Cafarnaum, com sua mãe, seus irmãos e seus discípulos; e ali só demoraram poucos dias. (São João 2,1-12).


O paralelismo entre este episódio e a queda da humanidade é notável, pois no livro do Gênesis existem três personagens, o homem (Adão), a mulher (Eva) e a serpente (Satanás), assim como nas bodas de Caná estão Jesus, Maria e as pessoas da festa – formando um indivíduo coletivo.

Os convidados da festa vieram falar com Maria, apelando para sua infinita caridade, pois não tinham mais vinho, assim como satanás foi falar com Eva, atentando para o fato de pedirem um milagre, enquanto a serpente pedia um pecado; pediram a intercessão de Maria, pois não tinham mais vinho que simboliza a alegria, e mais tarde, a Nova Aliança, ou seja, estavam afastados de Deus. Intrinsecamente, sabiam que o rei (Jesus) não recusaria um pedido da rainha-mãe (Maria), cf.: I Reis, 2,17-20.

Maria então solicita a Jesus fornecer aos convidados vinho, assim como Eva ofereceu a Adão a fruta e o fez entrar em pecado, Maria oferece a Jesus uma oportunidade de realizar o primeiro sinal para que cressem, e participassem da graça.

Além disso, ao falar com sua mãe, Nosso Senhor se utiliza do substantivo mulher, para nos remeter ao simbolismo da queda da humanidade

Maria então demonstra como conseguir esta nova aliança: fazendo a vontade de Jesus. E os convidados daquela festa por terem feito o que Jesus ordenou e como Maria ensinou, alcançaram o vinho, a Nova Aliança, e ainda depois disso, viram que o novo vinho era melhor que o primeiro, conforme predissera Jeremias (Jeremias 31,31).


Após o oferecimento da bebida, foi Jesus batizado e começou seu ministério público, passando então a abrir a “boca a favor do mundo, pela causa de todos os abandonados” e passou a “pronunciar sentenças justas” e fazer “justiça ao aflito e ao indigente.”, conforme Lhe aconselhara sua mãe, cumprindo o conselho dado pela rainha-mãe ao rei Lamuel, em Provérvios:

Dai a bebida forte àquele que desfalece e o vinho àquele que tem amargura no coração: que ele beba e esquecerá sua miséria e já não se lembrará de suas mágoas. Abre tua boca a favor do mundo, pela causa de todos os abandonados; abre tua boca para pronunciar sentenças justas, faze justiça ao aflito e ao indigente.(Provérbios 31,6-9)

Ajudadora


Quando Deus criou Eva, a primeira mulher, a quis por ajudadora de Adão (Gênesis, 2:18), do mesmo modo ao criar Maria, a quis por ajudadora de Jesus.

Esta certeza de que Maria é a ajudadora de Nosso Senhor, decorre imediatamente do papel que ela exerceu durante a vida de Jesus, ela está presente no nascimento do Emanuel, no primeiro milagre, em suas pregações e debates no Templo, no sacrifício do Calvário e no Pentecostes cristão, no qual nasceu a Igreja.

Portanto, ela O ajudou a cumprir a lei dos judeus a qual Jesus estava submetido, ao circuncidá-lo, ao apresentá-lo no Templo, ao levá-lo às festas judaicas, para aprender e ensinar na Sinagoga, a fornecer vinho novo.

Assim, ela mais fortemente cumpre seu papel de ajudadora, principalmente, quando das bodas de Caná ao suplicar a seu filho que dê o novo vinho, melhor do que o primeiro, a dar a Nova Aliança, primeiramente aos convidados daquela festa e depois a todos nós que nos tornamos irmãos em Cristo Jesus.

Assim, vemos que Eva foi a ajudadora de Adão no pecado, enquanto Maria é a ajudadora de Jesus, o Messias, o Cristo, na graça.


Maternidade


Finalmente, a maternidade de Eva se completa com a maternidade de Maria.

No livro do Gênesis, lemos que Adão deu o nome de Eva, à mulher, pois ela seria a mãe dos viventes (Gênesis 3,20). O nome Eva, em hebraico Havvah, oriunda da raiz hayah, quer dizer viver. Assim, Eva se tornou a mãe de todos os viventes, ou seja, de nós seres humanos.

Podemos encontrar este traço da maternidade de Eva em Maria, na narrativa da cena do Calvário. Cristo dá por consumado o seu ato de sacrifício pela humanidade ao entregar sua mãe aos cuidados do discípulo que amava:

Quando Jesus viu sua mãe e perto dela o discípulo que amava, disse à sua mãe: Mulher, eis aí teu filho. Depois disse ao discípulo: Eis aí tua mãe. E dessa hora em diante o discípulo a levou para a sua casa. Em seguida, sabendo Jesus que tudo estava consumado, para se cumprir plenamente a Escritura, disse: Tenho sede. São João 19,26-28.


O momento de encerramento do ato de redenção da humanidade, ou seja, da instituição de Jesus como novo Adão, acontece quando Jesus vela pelo destino de sua mãe, ao entregá-la ao apóstolo São João, discípulo que amava e uma das colunas da Igreja (Galátas 2,9), neste momento São João era o símbolo da Igreja que Jesus ama. Por extensão, Jesus nos exorta que recebamos Maria por nossa mãe, afim de que sejamos discípulos amados e possamos reclinar sobre o peito de Jesus.

São João, com a narração das bodas de Caná e da cena no calvário, quer demonstrar a plenitude da maternidade divina de Maria, ou seja, que ela não somente é mãe de Jesus, o Cabeça da Igreja, mas também de todos os membros do Corpo, ou seja, mãe da Igreja.


CONCLUSÃO


Como sabemos pela Sagrada Escritura, o Velho Testamento é uma figuração imperfeita do que viria, uma sombra do Novo Testamento (Hebreus 10,1). Da mesma maneira, a Nova Eva é maior que a antiga, que a Eva da Velha Aliança, da Velha Economia.

Assim, a Eva tendo sido criada sem a mancha do pecado original, muito mais Maria, a nova Eva, foi agraciada pelo Altíssimo de ser livre de toda a mancha desta herança. Deste modo, o fato de Maria ser a nova Eva, uma vez que a Palavra de Deus nos fala isso, prova de maneira sublime o dogma da Imaculada Conceição proclamado na bula Ineffabilis Deus pelo Papa Pio IX, em 8 de dezembro de 1854.

28.Por conseqüência, para demonstrar a inocência e a justiça original da Mãe de Deus, eles (Pais da Igreja) não somente a compararam muitíssimas vezes a Eva ainda virgem, ainda inocente, ainda incorrupta e ainda não enganada pelas mortais insídias da serpente mentirosa, como também a antepuseram a ela com uma maravilhosa variedade de palavras e de expressões. De fato, Eva escutou infelizmente a serpente, e decaiu da inocência original, e tornou-se escrava da serpente; ao contrário, a beatíssima Virgem aumentou continuamente o dom tido na sua origem, e, bem longe de prestar ouvido à serpente, com o divino auxílio quebrou-lhe completamente a violência e o poder. (SS. Pio IX, in Ineffabilis Deus, 1854)


Esta maravilhosa verdade, dogma de fé, dos católicos romanos, expressa a dignidade ímpar de Nossa Senhora, maior criatura de Deus, contudo não por mérito dela e sim por méritos de seu filho, Nosso Senhor e único Salvador Jesus Cristo. Conforme nos mostra Santo Agostinho :

Nem se deve tocar na palavra pecado em se tratando de Maria; e isto em respeito Àquele de quem mereceu ser a mãe, que a preservou do todo pecado por sua graça. (Sermão 215,3)

Por isso, a Igreja Católica, mesmo crendo que em Maria não há pecado, reconhece que ela também foi salva por Jesus. O que se coaduna com as Sagradas Escrituras, uma vez que cheia do Espírito Santo, Maria, no seu Magnificat, declara “meu espírito exulta de alegria em Deus, meu Salvador” (São Lucas, 1:47)

É importante notar que esta dignidade não está somente em ela ter concebido o nosso Salvador, Jesus, e sim por ela ter acreditado na Palavra de Deus, conforme as palavras de Santa Isabel e nas próprias palavras do Nosso Senhor Jesus Cristo:

Bem-aventurada és tu que creste, pois se hão de cumprir as coisas que da parte do Senhor te foram ditas!. (São Lucas 1,45)

Enquanto ele assim falava, uma mulher levantou a voz do meio do povo e lhe disse: Bem-aventurado o ventre que te trouxe, e os peitos que te amamentaram! Mas Jesus replicou: Antes bem-aventurados aqueles que ouvem a palavra de Deus e a observam!. (São Lucas 11,27-28).

Santo Agostinho se pronuncia de maneira magistral, para nos indicar sobre como devemos entender a dignidade de Maria:

De nada teria servido a Maria a intimidade da maternidade corporal se não tivesse, primeiro, concebido a Cristo de maneira mais feliz em seu coração; e só depois em seu corpo. (Sermão 215)

Palavras também expressas no parágrafo 968, do Catecismo Católico:

968 Mas seu papel [Maria] em relação à Igreja e a toda a humanidade vai ainda mais longe. "De modo inteiramente singular, pela obediência, fé, esperança e ardente caridade, ela cooperou na obra do Salvador para a restauração da vida sobrenatural das almas. Por este motivo ela se tornou para nós mãe na ordem da graça."


A analogia entre Maria e Eva pode causar espanto em cristãos de outras confissões, mas a Sagrada Tradição e o Sagrado Magistério da Igreja Católica são claros em contextualizar o simbolismo.

São Tomás de Aquino, o doutor angélico, ao comentar sobre a saudação do arcanjo Gabriel a Maria, demonstra claramente o caráter desta comparação:

Portanto, Eva não pôde achar em seu fruto o que também nenhum pecador achará em seu pecado. Acharemos, no entanto, tudo o que desejamos no fruto da Virgem. Busquemo-lo. Assim, pois, a Virgem é bendita, porém, bem mais ainda, é o seu fruto.

Deste modo, mais do que Maria devemos buscar a seu fruto, ou seja, Jesus.

Com toda a clareza, devemos buscar o fruto do ventre de Maria, Nosso Senhor Jesus Cristo, mas não podemos esquecer-nos dos mandamentos de Deus, nos dados através do Novo Testamento: proclamar Maria como bem aventurada e a acolhermos como mãe, para sermos discípulos amados.

Ainda de acordo com a Sagrada Escritura, Jesus é o novo Adão, o Adão espiritual, e Deus nos fala que “(...) não é bom que o homem esteja só; vou dar-lhe uma ajuda que lhe seja adequada” (Gênesis 2,18). Esta ajuda foi concretizada com a criação da nova Eva, Maria, a ajudadora de Jesus.

Por fim, devemos crer nas Santas Palavras do Catecismo Católico, parágrafos 970 e 975:


970 "A missão materna de Maria em favor dos homens de modo algum obscurece nem diminui a mediação única de Cristo; pelo contrário, até ostenta sua potência, pois todo o salutar influxo da bem-aventurada Virgem (...) deriva dos superabundantes méritos de Cristo, estriba-se em sua mediação, dela depende inteiramente e dela aufere toda a sua força." Com efeito, nenhuma criatura jamais pode ser equiparada ao Verbo encarnado e Redentor. Mas, da mesma forma que o sacerdócio de Cristo é participado de vários modos, seja pelos ministros, seja pelo povo fiel, e da mesma forma que a indivisa bondade de Deus é realmente difundida nas criaturas de modos diversos, assim também a única mediação do Redentor não exclui, antes suscita nas criaturas uma variegada cooperação que participa de uma única fonte.

975 Cremos que a Santíssima Mãe de Deus, nova Eva, Mãe da Igreja, continua no Céu sua junção materna em relação aos membros de Cristo.

domingo, 12 de setembro de 2010

SANTA CEIA DO SENHOR

Na Eucaristia,

A comunhão.

Com alegria,

Partir o pão.



Quem come d’Ele,

Já não morre,

Com Seu próprio sangue,

Ele nos socorre.



Na ceia do Senhor,

A grande luz,

Com muito amor,

O corpo de Jesus.



Banhados com o teu sangue,

Somos filhos teus

Verdadeira bebida,

Cordeiro de Deus.



Ele é o nosso pão,

Ele é a nossa comida,

Salvação,

O caminho, a verdade e a vida.



Isto é o meu corpo,

Disse o Senhor Jesus,

Estrela da manhã,

Que nos conduz.



Quem não distingue o corpo,

Não aceitou,

Que pelo poder do Santo Espírito,

O pão se transformou.



Nem só de pão viverá o homem,

Mas da Palavra da verdade,

Do vinho ao sangue,

A realidade.



A Ele a honra, a Ele a glória,

A Ele meu coração,

Na Santa Ceia,

A adoração.